segunda-feira, 7 de junho de 2010

O Poço

19. Seus servos cavaram outro poço no vale, e encontraram ali uma fonte de água viva. 20. Mas os pastores de Gerara começaram a disputar com os pastores de Isaac: “Esta água é nossa”, diziam eles. Isaac chamou então a esse poço Esec (Poço de Discussão), porque lho tinham contestado. 21. Abriram seus pastores um segundo poço, mas surgiu uma outra disputa, e por isso pôs-lhe o nome de Sitna (Poço de Reclamação). 22. Partindo em seguida dali, abriu outro poço, sobre o qual não houve mais discussão, e pôs-lhe o nome de Rehobot (Poço de Largueza), “porque agora, disse ele, o Senhor nos pôs ao largo, e prosperaremos na terra.”.

Tinha que sair, todos estavam comentando, era o assunto do dia, tudo tinha começado lá no poço, as mulheres tinham visto ele, e espalharam a notícia. O momento era aquele, era agora, sai, ao abrir à tenda a luz me cega por instantes, a multidão caminha, uma massa uniforme, um novo ser, como cardume, assim todos caminham, uma única direção...

Ele não estava lá à multidão toma novo rumo, e continua seu trajeto, nada pode deter aquele monstro gigantesco, que aumenta, a cada momento, caminhamos, subitamente, ele aparece, o monstro vira, prepara o bote, aquele ser indefeso, não tem chance, contudo a multidão estaca e esperam as palavras daquele que parece um pai.

Sua barba e cabelo uniam-se como a juba de um imponente leão, quando começava a falar agigantava-se e tocava o céu, ensinamentos fluíram como rios, embalados por sua música, acalentados por suas estórias, ensinados por suas leis e preceitos crescemos como nação e houve a paz, lembro-me perfeitamente, Ele veio do deserto e ao deserto retornou: sozinho, altivo, pacífico, deixou de ser homem, tornou-se mito, virou lenda.

— Neste poço, muito tempo atrás, quando a água ainda fluía, agora é apenas um ponto, na vastidão do deserto, serve para que contemos nossas estórias e lembremos nosso passado, bem meus filhos esta é a lenda do Peregrino, e muitas nações pelo mundo relatam aparições semelhantes.

Assim falava Belaié, a filho das águas, suas narrativas eram verdadeiras vertentes, corredeiras de ciência e humanidade era conhecido por vários epítetos tais como: o sábio, o profeta, o oráculo, o peregrino, o imortal, entre outros. Conhecido contador de lendas do deserto percorrera o mundo inteiro, diziam que de tanto caminhar sua perna ficara torta, outros falavam que era o peso do conhecimento, assim como suas lendas, Belaié também se tornara uma e não era para menos, pois, vivia sempre caminhando pelo deserto e de repente aparecia, alegrava as caravanas cansadas, os caminhantes desesperados, por uma noite permanecia, encantando todos, sobretudo as crianças com quem tinha um vínculo muito especial, suas aparições começaram a tornar-se sinal de benfazejo e milagre.

—Também foi aqui que deixou seu símbolo. – mostrou-nos uma pedra retangular amarelada que tinha uma rede mal traçada. – fiquei imaginando o que representaria aquele símbolo, perguntei a Belaié, ele apenas sorriu...

—Um importante homem disse: “Se alguém vem a mim e não odeia seu pai, sua mãe, sua mulher, seus filhos, seus irmãos, suas irmãs e até a sua própria vida, não pode ser meu discípulo.” Com esses discípulos conviveu, ensinou, foi traído e morreu, ele afirmava que estes discípulos tinham deixado de serem simples pescadores para tornarem-se pescadores de homens, acredito que este símbolo já é uma referência ao que esse homem dizia.

—Tudo está ligado desde o menor até o maior nível, a existência é regida por uma harmonia desconhecida por nós, mas que nos permite viver e existir com outras criações e assim o homem quando começou a compreender um pouco dessa vastidão que o cercava, percebeu como aquele conhecimento era precioso. No começo a informação foi mantida por estórias como a que contei, porém como o número de pessoas aumentou as estórias também se modificaram, surgiu um instrumento surpreendente, a escrita, e assim as estórias preservaram-se.

Tínhamos uma tradição de guardar nossas leis, costumes e lendas em uma caixa e enterrá-la em um ponto do deserto conhecido apenas por três pessoas: o ancião, o homem mais antigo entre nós; o líder, o atual chefe do grupo e um convidado, podia ser alguém que praticou um ato heróico. Era a isso que Belaié estava se referindo, chegara a época de retirar as “águas que não tem peixe”, assim eram conhecidos aqueles pergaminhos, pois eles alimentavam a alma e não o corpo.

Após escutarmos mais uma vez nossas leis e costumes, aquilo que já conhecíamos tão bem, afinal, tínhamos nascidos no deserto e sem dúvida morreríamos nele, partiram os três, Selasié, o velho; Menelique, o líder e Belaié o convidado. Saíam com um profundo tom marcial Selasié a frente mostrando o caminho e Menelique e Belaié atrás conduzindo a caixa, parecia o enterro de alguém, para nós aquilo tudo era muito chato o que importava mesmo eram as histórias de Belaié.

Ele nos olhava e dizia que tudo que contava, estava ali naquela caixa, mas para nós não podia ser como as palavras escritas pareciam mortas e por isso eram enterradas, enquanto as que Belaié pronunciava, essas ganhavam vida e nos transportavam para outras realidades, não podia um morto ser igual um vivo e só nesse momento não acreditávamos nele.

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